Simone Arthur Nascimento - advogada

Em tempos de pandemia, quando todos os meios de comunicação nos remetem à números crescentes de mortes por conseqüência da COVID19, vemos uma considerável parcela da sociedade minimizar a seriedade da situação sanitária, estimulando a retomada da vida normal. Essa postura negacionista não tem origem somente em posição ideológica/política, mas antes num comportamento social do brasileiro.

Culturalmente o brasileiro, via de regra, não enfrenta a morte como uma conseqüência natural da existência. Para a grande maioria, falar sobre morte ou planejar a vida após sua morte, é um tabu.

Esse comportamento fica muito evidente quando o advogado especialista em sucessões propõe ao cliente a lavratura de um testamento.

Repetidas vezes faz-se o silêncio e paira no ar o sentimento de que a simples lavratura do testamento resultaria numa programação de morte num futuro próximo, o que traduz a resistência a este tipo de ferramenta jurídica.

A partir daí começam as prorrogações para a adoção da medida e o planejamento sucessório pretendido não se efetiva, preso nas protelações.

É preciso superar essa resistência emocional à lavratura de testamento, pois ele constitui um excelente instrumento jurídico, capaz de solucionar diversas questões, independentemente da necessidade de um planejamento sucessório mais robusto e elaborado.

Como exemplos de questões jurídicas a serem solucionadas por meio do testamento podemos citar: reconhecimento de filhos concebidos fora do casamento, tutela de menores na ausência dos pais, administração do patrimônio destes menores, compensações patrimoniais entre os herdeiros necessários, reconhecimento remuneratório por meio de legado, destinação da herança quando não existirem herdeiros necessários, entre outros.

E para quem tem receio de beneficiar alguém no testamento e passar por alguma situação vexatória, decorrente da publicidade prematura de seu conteúdo, que é público, pode-se lavrar o testamento cerrado, que é totalmente sigiloso.

Diante do atual cenário mundial imposto pela pandemia, onde todos são confrontados diariamente com o derradeiro destino de qualquer ser vivo, seja a curto ou a longo prazo, vale a reflexão sobre o tema e a efetiva lavratura de testamento, organizando a vida familiar, societária e patrimonial, resolvendo questões pendentes e evitando conflitos futuros.